As minhas viagens mudaram, e as suas?
Se você também nasceu na era analógica, deve se lembrar muito bem como a gente organizava uma viagem. A agência mandava meia dúzia de folhetos de hotéis para você escolher um, a passagem de avião vinha em um carnezinho cheio de papel carbono e você levava um mapa da cidade todo dobradinho, que sempre era um trambolho para abrir no meio da rua.
Eu não posso dizer que havia planejamento, porque era tão difícil conseguir informações! A gente se fiava naqueles guias prontos de livraria e nas indicações de algum conhecido que por ventura já conhecesse o mesmo destino.
Minha primeira viagem para a Europa em família já tem mais de trinta anos. Nós saímos do Brasil com a passagem de ida e volta pela Air France, um hotel para os primeiros dias em Paris e um carro alugado. Só isso. Para passar 40 dias.
O roteiro era o seguinte. Meu pai acordava, abria o mapa rodoviário Michelin da Europa e escolhia: “ah, acho que hoje a gente consegue dirigir até Chamonix”. Você sabia o que tinha pra ver em Chamonix? Nós tampouco. E assim a gente partia feliz, sem hotel, sem saber nada sobre aquele lugar que havia sido escolhido. Fizemos um Grand Tour naquele verão. Cortamos a França, fomos para a Tchecoslováquia, descemos pela Áustria até a Itália e voltamos para o Sul da França, para aproveitar o calor da Riviera Francesa.
Passamos por lugares lindos totalmente sem querer. Não tínhamos pressa para nada. No Tirol austríaco, a gente chegava em cidades tão pequenas que as pessoas se escondiam dentro das casas, com vergonha por não saber falar a nossa língua. E as fotos? Aquele saco de rolos de filme que a gente só ia ver se prestaram um mês depois. E tome pilha pra máquina fotográfica, pilha pro Walkman, pilha pra todo lado.
Corta. Para hoje. Para as viagens na era digital. Só enquanto estou escrevendo aqui, tenho umas oito guias do Google abertas pesquisando viagens. Em um clique já aparecem centenas de hotéis para a cidade escolhida, com preços e avaliações de outras pessoas. Posso ver o trajeto todo entre o aeroporto e a cidade como se lá estivesse. Se eu perder o ônibus, meu celular já me diz que em quatro minutos passa outro que faz o mesmo percurso.
Ganhamos em comodidade e facilidade, mas perdemos em mistério. Já saímos de casa sabendo até qual o melhor ângulo para tirar foto da torre Eiffel, já sabendo o que vamos comer no restaurante e quanto vai custar. A gente começa a ter FOMO porque são 1.895 dicas mas só 5 dias na cidade. E começa a fazer gincana para dizer que fez check na lista toda.
Nestes tempos acelerados, o planejamento faz-se mandatório para não cairmos em armadilhas. É saber organizar um bom roteiro que faça sentido com a quantidade de informações que temos. Após o período de pandemia que passamos, a maioria dos pontos turisticos só recebe visitantes com agendamento de dia e horário. As pessoas voltaram a viajar muito, os vôos e hotéis ficam lotados e se você deixar tudo para cima da hora ou para “resolver lá” vai terminar frustrado. Quando eu quero muito conhecer determinada atração ou assistir a um espetáculo específico, coloco lembretes na agenda para comprar assim que abrem as vendas de ingressos. Já consegui comprar um evento que eu queria muito ir em uma viagem e que os ingressos acabaram em 3 minutos! Por isso é cada vez mais difícil viajar sem se organizar.
Eu gostaria de repetir o experimento de viajar sem nada resolvido. Só pegar minha malinha e embarcar.Já imagino que seria mais perrengue do que diversão. Você acha que daria certo?